sexta-feira, 14 de maio de 2021

O IMPACTO DO PODER NEGATIVO DAS TIPIFICAÇÕES E A TEORIA DOS PAPÉIS

 

Ao se pensar no sentido da terminologia da palavra poder, se faz necessário entender o que seria o significado da palavra potência. Podemos imaginar que alguns países considerados superpotências possuem armas nucleares, de destruição em massa, contudo, não necessariamente quer dizer que vão utilizar sem que haja alguma necessidade que justifique tal ato.

 

[...] A potência é a capacidade de efetuar um desempenho determinado, ainda que o ator nunca passe do ato.  [...] não é a mesma coisa atribuir-se a uma criança ou a um arquiteto a potência de construir uma casa. Num caso isto quer dizer que, quando a criança se tornar adulto, poderá ser um arquiteto: quem sabe? Isto não é impossível. No outro caso, quer dizer que este arquiteto, atualmente sem trabalho, construirá uma casa, desde que o contratem: é seu este poder. Por um lado, “potência” designa uma virtualidade: por outro, uma capacidade determinada, que está em condições de exercer-se a qualquer momento. (LEBRUN, 2009, p. 10).

 

Entendendo o que seria o significado de potência, agora se faz necessário entender o significado da palavra força. (LEBRUN, 2009, p. 11)Se numa democracia um partido tem peso político é porque tem força para mobilizar um certo número de eleitores. Se um sindicato tem peso político, é porque tem força para deflagrar uma greve”. Não necessariamente quer dizer que se precise utilizar a força por meios coercitivos que sejam violentos. Por exemplo, a força pode ser o charme da pessoa amada numa relação amorosa, quando extorque alguma decisão; (LEBRUN, 2009, p. 11), “uma relação amorosa, é, antes de mais nada, uma relação de forças”. A força é a canalização da potência, seria a sua determinação.

            Potência (macht) é a capacidade de impor a sua vontade contra a de uma ou mais pessoas, mesmo que haja resistência. Então, porque falar em poder e não em potência?


Poder inclui um elemento suplementar, que está ausente de potência. Existe poder quando a potência, determinada por uma certa força, se explicita de uma maneira muito precisa. Não sob o modo de ameaça, de chantagem etc., mas sob o modo da ordem dirigida a alguém que, presume-se, deva cumpri-la.   (LEBRUN, 2009, p. 12)

 

            Nas palavras de (LEBRUN, 2009), Parsons recusa-se a considerar o poder como sendo, essencialmente, “uma ação imposta por um ator a outro ator”.


[...] para ele, o poder não é simplesmente a capacidade de impor a sua vontade contra a de outra pessoa independente da resistência. [...] é antes, dispor de um capital de confiança tal que o grupo delegue aos detentores do poder a realização dos fins coletivos. Em suma, é dispor de uma autoridade, no sentido em que um escritor de renome, um pensador ilustre, um velho sábio... são autoridades no interior de um grupo dado (sem que esta autoridade implique uma ideia de coerção). (LEBRUN, 2009, p.14).

 

            É esse tipo de poder que acredito dever estar presente em determinadas tipificações e que se necessita fazer uso dele.


Quando assumimos o papel de gestor também assumimos as suas responsabilidades, como se colocássemos uma máscara. Segundo Goffman apud. Park (GOFFMAN, 1985) (nota de rodapé) pag. 27, “não é um mero acidente histórico que a palavra pessoa”, e sua acepção primeira, queira dizer máscara”. Nesse sentido, imagino que constantemente estamos interpretando papéis ou usando máscaras, que por sua vez, são legitimados pela institucionalização, ou forma de tornar padrão determinado agir ou costume.


A questão de saber quais são os papeis que se institucionalizam é idêntica à questão de definir quais áreas de conduta são afetadas pela institucionalização, e pode ser respondida da mesma maneira. “Toda” conduta institucionalizada envolve um certo número de papeis. Assim, os papeis participam do caráter controlador da institucionalização. Logo os atores são tipificados como executantes de papeis, sua conduta é ipso facto susceptível de reforço. (Peter L. BERGER, 2014, p. 100).

 

            O gestor não precisa gritar ou ser rude com o subordinado para interpretar o seu papel, por que a sua função dentro da empresa já traz consigo a autoridade do seu cargo.          Entretanto, quando me refiro a questão do reconhecimento sobre o poder das tipificações, tenho consciência de que a construção social da tipificação do papel do gestor é baseada nos comportamentos anteriores, consequentemente, traz consigo certo medo e antipatia por parte dos subordinados.

Há muito tempo já existe a função de encarregado no interior das empresas, independente de quem quer que esteja ocupando o cargo, e que isso não é uma questão de despotismo, ou seja, o indivíduo não nasce encarregado. Entretanto, mesmo que o sujeito (encarregado), que pode ser qualquer pessoa, queira agir de uma forma amigável sendo cordial com os subordinados, percebo que existe certa resistência e desconfiança por parte dos mesmos.

Geralmente quando alguns gestores se retiram do local aonde tenha acontecido alguma reunião alguns subordinados fazem sinal negativo ou falam mal, mesmo quando os gestores não tenham tido algum choque com eles e entendo esse aspecto como sendo o maior entrave em aplicar o reconhecimento como motivação, por que, primeiro deva deve-se resgatar a confiança do colaborador.


O comportamento do indivíduo se apoia totalmente no grupo. Os trabalhadores não agem ou reagem isoladamente como indivíduos, mas como membros de grupos. A qualquer desvio das normas grupais, o trabalhador sofre punições sociais ou morais dos colegas, no intuito de se ajustar aos padrões do grupo. Enquanto os padrões do grupo permanecerem imutáveis, o indivíduo resistirá a mudanças para não se afastar deles, dos colegas. (CHIAVENATO, 2003, p. 105).

 

            Existe determinado tipo de coerção imposto pelo grupo aos funcionários novatos que, subjetivamente, moldam os seus comportamentos fazendo com que aumentem ou diminuam o seu ritmo de trabalho, e isso é uma questão cultural na empresa que pode facilmente ser percebida. São os grupos informais, os quais serão abordados mais adiante.

 

A EXPERIÊNCIA DE HAWTHORNE

 

          

Primordialmente, a intenção de Elton Mayo[1] era a de achar alguma relação entre a produtividade e as condições físicas dos funcionários. Em princípio foram divididos dois grupos distintos de pessoas, separados por uma divisória, criando dois ambientes idênticos, com a iluminação controlada por um observador. Na medida em que se diminuía a iluminação das luzes de um dos dois lados o grupo diminuía a sua intensidade de trabalho, e quando aumentava a claridade, também se aumentava o ritmo de trabalho. Mayo percebeu que isso acontecia por fatores psicológicos e não por condições físicas, o grupo acreditava estar sendo mais intensamente observado quando se aumentava a luz e menos observado quando se diminuía. Esse fato caracterizou a primeira fase da experiência de Hawthorne.

 

Em 1927, o Conselho Nacional de Pesquisas iniciou uma experiência na fábrica de Hawthorne da Western Electric Company, situada em Chicago, para avaliar a correlação entre iluminação e eficiência dos operários, medida por meio da produção. A experiência foi coordenada por Elton Mayo, e estendeu-se à fadiga, aos acidentes no trabalho, à rotatividade do pessoal (turnover) e ao efeito das condições de trabalho sobre a produtividade do pessoal. (CHIAVENATO, 2003, p. 103).

 

Na segunda fase da experiência foram colocados dois grupos de moças num ambiente, separado dos demais operários da fábrica, esse grupo tinha uma supervisão com menos pressão sobre os funcionários, e os supervisores funcionavam como orientadores, as pessoas podiam conversar, rir e tinham alguns minutos de intervalos por dia.


Cinco moças montavam os relês, enquanto uma sexta operária fornecia as peças para abastecer o trabalho. A sala de provas era separada do departamento (onde estava o grupo de controle) por uma divisão de madeira. O equipamento de trabalho era idêntico ao utilizado no departamento, apenas incluindo um plano inclinado com um contador de peças que marcava a produção em fita perfurada. A produção foi o índice de comparação entre o grupo experimental (sujeito a mudanças nas condições de trabalho) e o grupo de controle (trabalho em condições constantes). O grupo experimental tinha um supervisor, como no grupo de controle, além de um observador que permanecia na sala e observava o trabalho e assegurava o espírito de cooperação das moças. Elas foram convidadas para participar na pesquisa e esclarecidas quanto aos seus objetivos: determinar o efeito de certas mudanças nas condições de trabalho (períodos de descanso, lanches, redução no horário de trabalho etc.). Eram informadas a respeito dos resultados e as modificações eram antes submetidas a sua aprovação. Insistia-se para que trabalhassem dentro do normal e que ficassem à vontade no trabalho. (CHIAVENATO, 2003, p. 103).

 

O comportamento desse grupo experimental coloca em xeque a teoria cientifica e clássica da administração, pois, querendo mostrar a sua satisfação o grupo passou a produzir mais. Com isso, Mayo percebeu que as condições físicas das pessoas não eram o fator principal para o aumento na produção, mas as pessoas em geral são motivadas por expectativas grupais, psicológicas e sociais e é nesse contesto que acredito, o das expectativas por reconhecimento e respeito no trabalho, que se possa atuar, contudo, não sendo desonesto para se obter um resultado especifico, mas, sendo justo e honesto respeitando o funcionário tratando-o com respeito e cordialidade.


A experiência da sala de montagem de relés trouxe as seguintes conclusões: as moças gostavam de trabalhar na sala de provas porque era divertido e a supervisão branda (ao contrário da supervisão de controle rígido na sala de montagem) permitia trabalhar com liberdade e menor ansiedade; havia um ambiente amistoso e sem pressões, no qual a conversa era permitida, o que aumentava a satisfação no trabalho; não havia temor ao supervisor, pois esse funcionava como orientador; houve um desenvolvimento social do grupo experimental. As moças faziam amizades entre si e tornaram-se uma equipe; o grupo desenvolveu objetivos comuns, como o de aumentar o ritmo de produção, embora fosse solicitado a trabalhar normalmente. (CHIAVENATO, 2003, p. 104).

 A produtividade aumentou nessa fase sem que fosse preciso criar um plano salarial como fator motivacional para atender algum tipo de demanda. Percebesse que os trabalhadores também têm as suas demandas por boas condições de trabalho e a condição de poder opinar e poder influenciar na melhoria do modo de trabalho gera, de certa forma, uma situação de reconhecimento da sua capacidade intelectual e social de modificação que, acredito, também está relacionado ao prestigio no trabalho.

Na terceira fase da experiência de Hawthorne, preocupados com o comportamento e atitudes diferentes entre as moças do grupo experimental e as do grupo de controle, os pesquisadores abriram mão do escopo inicial de averiguar as condições físicas de trabalho e passaram a dar mais atenção no estudo das relações humanas no trabalho.


Verificaram que, no grupo de controle, as moças consideravam humilhante a supervisão vigilante e constrangedora. Apesar de sua política pessoal aberta, a empresa pouco ou nada sabia acerca dos fatores determinantes das atitudes das operárias em relação à supervisão, aos equipamentos de trabalho e à própria organização. (CHIAVENATO, 2003, p. 104).

 

            Em 1928 é dado o início a um programa de entrevistas, Interviewing Program, para conhecer as atitudes e sentimentos dos operários e entender a sua opinião em relação ao tratamento que recebiam no seu trabalho, como também escutar sugestões a respeito do treinamento dos supervisores. “Adotou-se a técnica da entrevista não-diretiva, que permitia que os operários falassem livremente, sem que o entrevistador desviasse o assunto ou tentasse impor um roteiro prévio. ”, (CHIAVENATO, 2003, p. 105).

            Contudo, passa a acontecer na empresa um certo tipo de organização informal[2], por parte dos funcionários, que faz com que os operários se mantenham unidos por laços de lealdade, ou seja, uma lealdade comum dividida entre eles que molda e determina o comportamento de todos. Os trabalhadores passam a regular, de certa forma, a produção diária, diminuindo ou acelerando a produção. Alguns trabalhadores se sentem divididos entre a empresa e a lealdade ao grupo, e isso gera conflito, tensão, inquietação e descontentamento entre eles.

Para estudar esse fenômeno, os pesquisadores desenvolveram uma quarta fase da experiência de Hawthorne. Foi escolhido um grupo experimental para trabalhar em uma sala especial com condições de trabalho idênticas às do departamento. Um observador ficava dentro da sala e um entrevistador do lado de fora entrevistava o grupo.

 

Assim que se familiarizou com o grupo experimental, o observador pôde constatar que os operários dentro da sala usavam várias artimanhas -logo que os operários montavam o que julgavam ser a sua produção normal, reduziam seu ritmo de trabalho. Os operários passaram a apresentar certa uniformidade de sentimentos e solidariedade grupal. O grupo desenvolveu métodos para assegurar suas atitudes, considerando delator o membro que prejudicasse algum companheiro e pressionando os mais rápidos para "estabilizarem" sua produção por meio de punições simbólicas. Essa quarta fase permitiu o estudo das relações entre a organização informal dos empregados e a organização formal da fábrica. (CHIAVENATO, 2003, p. 105).

 

O interessante é que essa questão de o grupo desenvolver uma relação de controle uns sobre os outros, para aumentar ou diminuir o ritmo de trabalho, é como se fosse um fato social, os indivíduos para não sofrerem sanções agem de acordo com a maioria para não serem excluídos do grupo. Mesmo que um funcionário queira trabalhar mais depressa, quem vai determinar o ritmo é o grupo.


Os operários preferiram produzir menos - e ganhar menos - a pôr em risco suas relações amistosas com os colegas. Cada grupo social desenvolve crenças e expectativas em relação à Administração. Essas crenças e expectativas - sejam reais ou imaginárias - influem nas atitudes e nas normas e padrões de comportamento que o grupo define como aceitáveis. As pessoas são avaliadas pelo grupo em relação a essas normas e padrões de comportamento: são bons colegas se seu comportamento se ajusta a suas normas e padrões de comportamento ou são péssimos colegas se o comportamento se afasta delas. (CHIAVENATO, 2003, p. 105).

 Isso comprova que o aumento ou diminuição da produção não está totalmente relacionado ao fator econômico, mas, o indivíduo se apoia no comportamento do grupo.

A Experiência de Hawthorne foi suspensa em 1932 por motivos financeiros. Sua influência sobre a teoria administrativa foi fundamental, abalando os princípios básicos da Teoria Clássica então dominante.

 Embora pareça uma coisa obvia a importância de o fato das relações humanas no trabalho ser uma coisa fundamental para influenciar na produção, poucos gestores se abstêm a tomar esse tipo de atitude e acham normal utilizar o método antigo de gestão por cobrança e pressão, pois, não se utilizando de tais métodos, subjetivamente, se mantém certo tipo de status quo, e estratificação no trabalho. O trabalhador, acredito, tem que se sentir desafiado a encontrar novas alternativas de melhoria e se sentir participativo no processo do trabalho diariamente. A questão da produção no trabalho não é proporcional a quantidade de pessoas.

 



[1]      Mayo conduzira uma pesquisa em uma indústria têxtil com elevadíssima rotatividade de pessoal, algo em torno de 250% ao ano e que havia tentado inutilmente vários esquemas de incentivos salariais. (CHIAVENATO, 2003, p. 102).

           [2]      O Programa de Entrevista revelou a existência da organização informal dos operários afim de se protegerem contra o que percebiam como ameaças da Administração. Essa organização informal manifesta-se por meio de: a. padrões de produção que os operários julgam ser a produção normal que deveriam ter e que não eram ultrapassados por nenhum deles; b. práticas não-formalizadas de punição social que o grupo aplica aos operários que excedem os padrões e são considerados sabotadores; c. expressões que fazem transparecer a insatisfação quanto aos resultados do sistema de pagamentos de incentivos por produção; d. liderança informal de alguns operários que mantem o grupo unido e asseguram o respeito pelas regras de conduta; e. contentamentos e descontentamentos em relação às atitudes dos superiores a respeito do comportamento dos operários. (CHIAVENATO, 2003, p. 105).